“Trago
em mim a terrível desconfiança de que um dia serei
declarado santo.”
“Aos
seres humanos que não me interessam, desejo sofrimento, desolação,
doença, maus-tratos e indignidades – desejo que não continuem a
desconhecer a profunda autodepreciação, a tortura da
autodesconfiança, a miséria dos derrotados.”
“Sabemos
que a vida consiste em sofrimento e que, quanto mais nos esforçamos
para aproveitá-la, mais ela nos escraviza. Devemos, portanto, abrir
mão das vantagens que ela nos oferece e praticar a abstinência.”
“Essas
pequenas coisas – alimentação, ambiente, clima, lazer, toda a
casuística do egoísmo – superam toda e qualquer concepção de
maior importância, a que se deu relevância até agora.”
“Entre
os vivos, não há ninguém que me interesse muito.
As pessoas que admiro já morreram faz muito tempo – por exemplo, o
abade Galiani, Henri Beyle ou Montaigne.”
“Ele
[Montaigne] envolveu-se em atividades práticas [...] Não repudiou a
vida; mas mergulhou nela [...] Tomou para si o maior número possível
de responsabilidades [...] O que ele queria era a totalidade; e
combateu a divisão entre a razão, a sensualidade, a emoção e a
vontade.”
“E
se o prazer e o desgosto estiverem tão intimamente ligados que todos
aqueles que quiserem
obter
o máximo possível de um devem
também
ter o máximo possível do outro [...] Existe uma escolha: ou o
mínimo possível
de prazer,
em resumo, ausência de sofrimento, ou o mínimo
possível de desgosto,
como o preço a pagar por uma produção de prazeres e alegrias sutis
em profusão que raramente já foi desfrutada? Se se decidir pelo
primeiro caso e se desejar diminuir e reduzir o nível de sofrimento
humano, tem-se também de diminuir e reduzir o nível de sua
capacidade para a alegria.”
“Examinem
a vida das pessoas e dos povos mais brilhantes e mais produtivos e
perguntem a si próprios se uma árvore que deve alcançar uma altura
invejável pode prescindir do mau tempo e das tempestades e se o
infortúnio e a resistência externa, alguns tipos de ódios, a
inveja, a obstinação, a desconfiança, a insensibilidade, a avareza
e a violência fazem, ou não, parte das condições favoráveis sem
as quais qualquer grande progresso, mesmo o da virtude, quase nunca é
possível.”
“Como
alguém pode se tornar um pensador se não passar ao menos um terço
do dia sem paixões, gente e livros?”
“Apenas
os pensamentos que vêm à mente durante uma caminhada têm algum
valor.”
“Quando
contemplamos aquelas depressões de sulcos profundos nas quais as
geleiras se aninham, pensamos que dificilmente haverá um tempo em
que um vale arborizado e coberto de grama, banhado por riachos, irá
estender-se exatamente no mesmo local. O mesmo acontece na história
da humanidade: forças selvagens abrem caminho e são essencialmente
destrutivas; mas sua ação é necessária para que mais tarde uma
civilização de melhor índole dê continuidade à sua estirpe. As
energias terríveis – que são chamadas de mal – são como
ciclópicos e desbravadores da humanidade.”
“Devemos
aprender a suportar tudo aquilo que não podemos evitar. Nossa vida
compõe-se, como a harmonia do mundo, de dissonâncias e de
diferentes tons, maviosos ou estridentes, sustenidos e bemóis,
suaves e grandiosos. Se um músico gostasse de apenas alguns deles, o
que lhe restaria para cantar? Ele precisa saber como usar e combinar
todas as variedades de tons. Da mesma forma devemos agir com relação
ao bem e ao mal, pois são eles que formam a essência de nossa
vida.”
“Se
fôssemos ao menos terrenos férteis, não permitiríamos que nada se
tornasse inútil e veríamos em cada acontecimento, em cada coisa e
em cada homem um adubo bem-vindo.”
“Não
falem em dom ou talento inato! Podem-se citar grandes homens que não
foram muito talentosos. Eles adquiriram grandeza, tornaram-se
‘gênios’(como se costuma defini-los), por intermédio de
atributos sobre os quais aqueles que sabem não possuí-los não
gostam de falar: todos eram dotados da mesma seriedade e perseverança
de um artesão, que aprende em primeiro lugar a construir de maneira
adequada as partes antes de ousar fazer o todo. Eram pacientes porque
dava-lhes mais prazer executar bem as coisas pequenas e secundárias
do que admirar o efeito deslumbrante do todo.”
“Como
um jardineiro, podemos dispor de nossa intuição e pendores e
realizar o que poucas pessoas sabem, ou seja, cultivar as sementes da
cólera, da piedade, da curiosidade e da vaidade de maneira tão
fecunda e rendosa como se cultiva uma bela árvore frutífera em uma
treliça.”
“[Acreditamos
que] aquilo que é superior não pode se originar do inferior, não
pode florescer
de maneira alguma [...] Tudo o que é de primeira ordem deve ser a
causa de si mesma.”
“As
coisas boas e elevadas estão habilidosamente relacionadas, unidas e
entrelaçadas às coisas más e ostensivamente antitéticas. O amor e
o ódio, a gratidão e a vingança, a tolerância e a revolta têm a
mesma raiz.”
“Os
sentimentos de ódio, inveja, cupidez e desejo de dominação são
determinantes da vida e devem, fundamental e essencialmente, estar
presentes na economia total da vida.”
“Quanto
mais intensas e mais terríveis forem as paixões que uma época, um
povo ou um indivíduo podem se permitir, porque são capazes de
utilizá-las como um
recurso,
mais elevada é a
sua cultura.”
“Eles
não repudiavam o impulso natural que se manifestava nas qualidades
negativas, mas optavam por aceitá-lo e – logo após terem
descoberto um número suficiente de medidas acautelatórias capazes
de fornecer a essas águas revoltas um meio o mais inofensivo
possível de serem canalizadas e escoadas – confiná-lo, definindo
para ele dias e cultos determinados. Essa é a raiz de toda a moral
da liberdade de espirito da Antiguidade.”
“Toda
paixão passa por uma fase que se pode chamar de no mínimo
desastrosa, na qual sua vítima verga sobre o peso da estupidez. Em
seguida, vem o período em que o espírito se acomoda, a vítima
‘espiritualiza-se’. Em tempos remotos, devido à estupidez da
paixão, as pessoas travavam com ela uma verdadeira batalha; planejam
destrui-la […] Destruir
as
paixões e os desejos apenas para evitar-lhes a estupidez e as
consequências desagradáveis dessa estupidez nos parece nos dias de
hoje ser, em si mesma, simplesmente uma forma aguda de estupidez.
Foi-se o tempo em que costumávamos ficar maravilhados quando um
dentista arrancava
um
dente para fazer cessara a dor.”
“Muitas
vezes causaram-me extrema repugnância as manifestações de
camaradagem entre os frequentadores da sede do clube [...] Mal podia
suportar determinados indivíduos e seu materialismo etílico.”
“Quanta
cerveja há na inteligência alemã!”
“Devo
aconselhar com demasiada gravidade a todos de natureza mais
espiritual a se abster absolutamente do álcool. Água é
suficiente.”
“Se
um indivíduo recusa-se a permitir que seu próprio sofrimento recaia
sobre si mesmo durante uma hora e se tenta constantemente precaver-se
contra o infortúnio e antecipar-se a ele; se encara o sofrimento e o
desprazer como algo nocivo e merecedor de aniquilamento ou como um
defeito da existência, então torna-se evidente que esse indivíduo
abriga em seu coração a religião
do comodismo.
Como essas pessoas sabem pouco a respeito da felicidade
humana!
A felicidade e a infelicidade são irmãs, são, até mesmo, gêmeas,
que ou crescem juntas, ou, como no caso desses a quem me refiro,
permanecem unidas em sua pequenez.”
“Todas
essas linhas de pensamento que julgam o valor das coisas em
conformidade com o prazer
e
a dor,
e de acordo com os fenômenos circunstanciais e secundários, são
superficiais e ingênuas. A consciência, não só do artista como a
de qualquer pessoa que não ignore a existência de uma energia
criativa,
irá desprezá-las e tratá-las com escárnio.”
“Para
acreditar que o vinho tem a propriedade de deixar alguém bem
disposto, eu teria de ser cristão, isto é, crer – o que, para mim
em especial, é um absurdo.”
“Lanço
contra a Igreja as mais terríveis palavras de acusação que
qualquer promotor jamais proferiu. Para mim, ela é a forma mais
extrema de corrupção que se possa conceber [...] nada escapa à sua
depravação [...] Considero o cristianismo a única
grande
praga, a única
grande
depravação intrínseca.”
“Faz
muito bem aquele que calça luvas para ler o Novo Testamento. A
proximidade com tanta sujeira quase nos força a isso [...] Tudo o
que o cristianismo prega é a covardia, a autoilusão e a alienação
do ser humano quanto à sua própria condição [...] Será que ainda
preciso acrescentar que em todo o Novo Testamento existe uma única
e
solitária figura que se deve respeitar? Refiro-me a Pilatos,
governador romano da Judeia.”
“Nosso
destino é sermos eremitas intelectuais e travar conversas ocasionais
com algumas pessoas cuja mentalidade se assemelha à nossa.”
“Não
quero mais ser um solitário. Quero reaprender a ser um ser humano.
Ah, quanto a isso, tenho praticamente tudo a aprender!”
“Minha
insegurança agora é imensa [...] Tudo o que me chega aos ouvidos me
faz pensar que as pessoas me desprezam.”
“Não
gosto da minha mãe, e a voz da minha irmã causa-me uma certa
ojeriza. Sempre adoecia quando estava em companhia das duas.”
“Dores
constantes, uma sensação de hemiplegia, um estado próximo ao dos
mareados, durante o qual sinto dificuldades de falar – essas
sensações prolongam-se por várias horas por dia. Para minha
diversão tenho ataques apopléticos (o mais recente forçou-me a
vomitar durante três dias e três noites; fico mortalmente sedento).
Não consigo ler! Raramente consigo escrever! Não consigo ouvir
música!”
“Para
a doença masculina do autodesprezo o remédio mais eficaz é ser
objeto do amor de uma mulher inteligente.”
“Ler
um livro, logo pela manhã, ao nascer do sol, quando se está no auge
do vigor físico e do frescor espiritual – chamo isso de mórbido!”
“O
combate às doenças da humanidade gerou uma doença ainda mais
grave. A longo prazo, o que parecia a cura acabou por agravar os
males que pretendiam eliminar. Por ignorância, acreditou-se que os
métodos de efeitos imediato que só faziam entorpecer e inebriar, as
supostas consolações,
eram verdadeiras curas. Ninguém foi capaz perceber que, muitas
vezes, preço que se pagava por esse alívio imediato trazia um
agravamento geral e profundo sofrimento.”
“Considerar
os estados de
infortúnio em
geral como um obstáculo, como algo que deve ser abolido,
é a [suprema estupidez], representa um verdadeiro desastre em suas
consequências... quase tão estúpido quanto a pretensão de se
abolir o mau tempo.”
"Ninguém
pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para
atravessar o rio - ninguém, exceto tu."
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