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22 de outubro de 2020

Alan Moore

(…) Talvez a maior da minhas vaidades seja a tentativa de esconder minha imensa vaidade, mas, por favor, não perca o seu tempo com isso.”


O que eu faço é ficar sentado numa sala escrevendo – deve ser uma das existências mais sem graça do mundo.”


(…) Quanto mais envelheço, menos fico preocupado em me revelar e ficar com cara de bunda.”


Se amanhã fôssemos juntar todos os líderes, colocar no paredão e fuzilar – e permita-me curtir essa ideia tão doce mais um pouquinho antes de jogar fora –, se fizéssemos uma coisa dessas, a sociedade provavelmente entraria em colapso, pois a grande maioria da população passou milhares de anos condicionada a depender de líderes que venham de uma fonte externa. Virou muleta de muitos. Caso você chute a muleta, essa gente vai despencar e levar a sociedade junto. Para se atingir um estado funcional e real de anarquia, é óbvio que você tem que instruir esse povo – e tem que ser instrução massiva – pensando num estado no qual elas pudessem assumir responsabilidade pelo que fazem.”


O que tento é pegar crenças políticas com grande potencial de impopularidade e deixo-as mais acessíveis, tento levar ideias bem amplas e bem complexas às crianças, num formato que elas entendam.”


Sempre existe a possibilidade de que parte da sua mensagem vai se perder, que parte dela vai ser embotada. Mas existem estratégias, existem maneiras de dar a volta nessas coisas. Se você for esperto, você encontra um jeito de passar a perna em quem te contrata e imprimir o que há de mais sórdido, de mais incendiário.”


Eu e outros garotos e garotas da minha idade, alguns da escola de ensino médio que eu frequentava, outras da escola para moças, decidimos espontaneamente montar uma revista. Basicamente para veicular poesia ruim. Chamava-se Embryo; de início ia se chamar Androgyne, mas eu descobri que as letras não cabiam na capa e aí encurtei. Era uma bagunça.


Eu escrevia o que achava ser poesia. Eram geralmente umas coisas angustiadas, arrependidas, sobre a tragédia da guerra nuclear, que na verdade tratavam da tragédia que era eu não ter namorada.”


Não creio que eu seja um desses palhaços que chora por dentro, e sim um trágico que ri por dentro. Minhas comédias preferidas são as que têm um toque de tragédia. Minhas tragédias favoritas são aquelas em que você quase se pega rindo.”


Entenda, por favor, que ainda não estou totalmente lesado pelas drogas nem tão confiante no meu próprio intelecto a ponto de sugerir que chegaremos a uma solução, ou algo que lembre uma solução. Só quero apresentar as questões da forma que as vejo, à luz mais interessante possível.”


Eram os anos 1980, tínhamos uma Boadiceia insana da direita governando o país e eu estava muito pessimista, em termos políticos, sociais e vários outros. Então era comum isso se refletir no meu trabalho… eu não diria que o que faço agora tem só coelhinhos fofos e céu azul, mas acho que tem um lado mais otimista do que o que eu fazia nos anos oitenta. O século mudou.”


Somos um bando de gente bem criativa e quando a coisa fica medonha, como anda ficando, no fim das contas o que interessa é se vamos contornar o problema ou não… a morte pendendo sobre a cabeça tende a dar um foco maravilhoso à mente. Pode ser que alguns problemas incitem suas próprias soluções, portanto. Assim espero.”


Não tenho desejo algum de ser moderninho. Não tenho vontade alguma de fazer parte da indústria de quadrinhos. Tenho grande interesse pela mídia… estou tentando criar um universo interessante que renda imaginação para garotos, para adolescentes ou crianças ainda mais novas. E isso me parece válido.”


Ser artista e ser mecânico é a mesma coisa. É pura questão de aplicação. Não tem nada de místico.”


"A ideia de que existe algum prestígio em ver seu trabalho virar filme, isso é uma coisa que me deixa indignado porque parece que todo mundo na indústria acredita na piada. Pra mim isso quebra a única motivação que eu tenho para trabalhar todos esses anos nos quadrinhos, que é fazer a mídia evoluir. Todo mundo com quem eu falei nesses anos, eles também me diziam que era isso que queriam. Acabou, contudo, que ao primeiro sinal de que o trabalho deles poderia virar filme, a atitude mudou. Parece que sua HQ virar filme é o que valida a HQ, que antes era só um gibi e agora é cinema.”


(…) É assim que eu posso ter utilidade. Me deram essa influência que eu não pedi para ter, que consiste em muita gente conhecer meu trabalho. Não é uma coisa que eu busquei, mas existe, e se de alguma forma for necessária para ajudar a deter a maré da idiotia, então que eu sirva para isso.”


Quando eu era garoto, inventei uma Fantasia ridícula, muito mal pensada, do tipo de Figura que eu poderia ser quando crescesse. E o mais horripilante é que ela se concretizou nos mínimos detalhes.”


Se se pode preencher gibi atrás de gibi, mês sim, mês também, com porrada, então, pode-se preencher pelo menos um gibi com um ato sexual. Claro que vai ser tão interessante quanto porrada.”


O grande chamariz em mostrar figuras totalmente dessexualizadas, como Belinda, Pafúncio ou Popeye, participando em esquetes pornográficos está no contraste mais amplo que se cria, dado que o conteúdo sexual parece mais sujo quando no contexto de um ícone cultural até então imaculado. Existe também o prazer subversivo em alfinetar a visão anódina e assexuada da sociedade representada pelas tirinhas de jornal.”


Claro que tanto o sexo quanto a expressão sexual são políticos e sempre foram, mas foi só no final dos anos sessenta e nos setenta que passaram a ser vistos como tais de maneira ampla. Da mesma contracultura sessentista que deu ascensão a Robert Crumb, catapultou-se o feminismo que gerou as críticas mais ferozes ao quadrinista.”


(…) Se você vive numa época de repressão política em que tem uma pauta aparentemente ditada pelos fundamentalistas que se infiltram não só nos Estados Unidos, mas em todos os países contentes em ficar à sombra dos EUA, não há outra opção que não declarar o que se pensa, da forma que for possível, ou calar-se.”


Ao invés de nos abrirmos a uma relação saudável com nossa própria imaginação sexual, somos conduzidos à recônditos sombrios pela vergonha, pelo constrangimento e pelas culpas, e estes recônditos sombrios geram monstros de toda natureza.”


As culturas de sexualidade aberta e progressista, como a da Grécia antiga, deram ao Ocidente quase todos os seus aspectos civilizatórios, enquanto as culturas de repressão sexual, como a da Roma tardia, nos deram a Idade Média.”


Ilumine seu pedacinho de terra, as pessoas que você conhece, as coisas que você quer celebrar. Ilumine com sua arte, com sua música, com seus escritos, com seja lá o que você faz. Faça isso que pouco a pouco ele pode virar, se não um mundo melhor, pelo menos um mundo mais esclarecido.”


Sou bem mais estranho do que o que eu disse. Só estou lhe passando o resumo rápido, comercial, aceitável. Ainda tenho meus segredos.”

8 de outubro de 2020

sem comparação

deuses carentes

criados

para cobrar adoração

amaciando a carne

para instaurar

a santidade da abnegação

alardeando

a existência de um espírito

capaz de aguentar

uma vida de sacrifícios

acalentando expectativas

para os que acreditam

que precisam de perdão

por existir

para sorrir

e viver

exigindo

que o universo

funcione tão somente

para lhe gerar gratificação.