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13 de março de 2013

Rotina

Se lhe perguntassem, o que você responderia? Pediria desculpas e diria que, sobre estas questões, você não opinaria? À qual defesa você recorreria? Eu só gostaria que você me mostrasse onde é que está a sanidade em se adaptar a esta correria doentia. Acha normal sermos pressionados a agir como verdadeiros animais de corrida? Você já teve tempo e vontade para interrogar seu íntimo, algum dia? Enquanto continuarmos a aceitar que necessitamos de leis, de mandamentos, de garantias ou de punições para assegurarmos o desenvolvimento de sentimentos tais como o respeito, a honestidade, a justiça – estaremos à mercê de interesses estruturalmente contrários à interpretação, aos embates entre os discernimentos sobre como nos portamos diante de nossa liberdade, de nossa vida. Você me diz que só quer satisfazer seus apetites. Sem qualquer ideal construtivo, muito envaidecido por estar cada vez mais próximo dessa indiferença que também se comercializa. Acha mesmo que tudo é muito complexo a ponto de desistir? Só porque existe essa distância entre nós, essa solidão que nos aproxima?! Vamos lá! Do quê você gosta? A que e a quem se dedicas? Se o meio o coíbe, você cede? Se o teu interior te chama, você tapa os ouvidos? Mantém o alto-astral, mesmo que não haja alegria? Os especialistas entrevistados discursam sobre a dignidade, especulam sobre quais investimentos serão necessários para alcançarmos a excelência dos serviços coletivos – enquanto eles mesmos não dispensam uma overdose diária de regalias. A fome não os sensibiliza. Para os que vivem de verdade, tudo isso não passa de notícias. Profissionais supérfluos ocupando cargos mais supérfluos ainda.

10 de março de 2013

Esperança

Ando me preparando
Para viver minha vida
Suando agora
Para que
Quem sabe um dia
Eu possa vivê-la bem do jeito que a imagino

Ando esbanjando meus momentos
Em lamentos
Que não suspendem os tormentos
Vulgarizam o sentido
Do que já foi vivido
E substituído pela busca do impossível

Ando me sacrificando
Em razão de um futuro
Que eu desconfio não poder existir
Minha saúde, meu corpo
Neste ritmo
Podem muito bem escapulir

E eu
Que me ilidi
Vou poder repetir
Junto de muitos outros
Com quem convivi:
Minha vida já passou e o que é que eu fiz?

Corri
Ganhei, perdi
Subsisti até agora
Numa luta infernal
Para tentar manter
O que ainda não consegui?

8 de março de 2013

Retrocesso

Fazemos escolhas, mas o que queremos? Sabemos ou fazemos sem por quê? Só por que temos e os outros também estão a fazer? Escolhas que advém de interesses. Erros e acertos?! Só isso, mesmo? Vontade de intervir por intermédio? Nossas mentes insistem em polarizar, acrescentado exageros. Busca por segurança. Interpretação para a sobrevivência. Por algo que nos falta. Por algum novo problema. Que surgiu com a hipocrisia. Com a demagogia para monopolizar os meios. Distrações passageiras. Recursos que privilegiam o acesso. Barrando o necessário desenvolvimento. Sem evidências qualquer crença passa a funcionar como cabresto. Conselhos para que não saibamos as razões de nos inculcarem tantos medos...

6 de março de 2013

Formação de docentes

É compreensível que isso aconteça. O conflito. A situação de inquietação. A rebeldia. A resistência. A sensação de nada poder fazer sem o auxílio de nossas consciências. No entanto, isso abre a possibilidade de outra discussão. Mais intensa. Que se propõe a ir até às soluções para estes enfrentamentos. Vocês gostam de serem tratados (as) como ovelhas desgarradas? Como criancinhas que precisam ser vigiadas? Punidas? Reprimidas? Forçadas? Pastoreadas para se educarem? Por que não gostam? Por que ninguém gosta? Vocês não entenderam que há gente querendo mandar na gente? Gente que fala muito mais de regras, de normas, de leis? Que exige cumprimentos, mas não explicam que estas convenções foram aceitas e que podem muito bem serem mudadas, caso haja maturidade para reivindicarmos nossos direitos. E não nos tratarmos como obstáculos quando o que queremos é viver mais contentes. Falo de liberdade enquanto possibilidade de agir com responsabilidade, em conjunto com todos os seres viventes. Liberdade que não se conquista quando nos tratamos e aceitamos sermos tratados desse jeito. Infantilista como vocês podem ver. Nós convivemos e precisamos caminhar por nós mesmos. Sozinhos, mas juntos. Cheios de disposição para coexistirmos e intervirmos neste planeta. Posicionados ao lado da continuidade da vida, não do seu escoamento. Resignificando nossas existências. Educação só se faz com respeito, meus amigos e amigas. Pelo convite, pela sugestão, pela vontade de conhecer e não vivermos a esmo.

                                                             (Dedicado ao 1º FD)

Terra

Ela se expressa, mas não se revela. É necessário que haja alguém para interpretá-la. Expressar suas impressões. Provocando uma porção de entendimentos. Ela se expressa enquanto processo. E é bem possível que não dispomos de instrumentos capazes de captá-la enquanto objeto inteiro. Mesmo os especialistas às vezes reconhecem que suas especialidades são o primeiro impasse para resolver tal problema. Ela se expressa, e a gente percebe. Sente. Pensa. Algo que parte de nós, não dela. Algo que faz com que a gente reaja. Entendendo. Nossas solidões e também as dela. Aquilo tudo que faz com que gente tão diferente pareça gente tão semelhante quando diante dela.

3 de março de 2013

O reflexo

Eu?! Ah, não diga que você não sabe. Chega a ser até estranho que você não tenha ouvido falar de mim. Todo mundo me conhece e me admira por aqui. Eu sou uma pessoa super do bem. Sempre muito descontraída. Sempre, sempre de bem com a vida. Eu não tenho preconceitos. Minha cabeça é bem aberta. Tão aberta que minhas ideias insistem em escapulir quando mais preciso reuni-las. Deve ser por isso que a galera vive me dizendo que eu falo as mesmas coisas, conto as mesmas histórias toda vez que saímos. Ora, me poupe! Eu sou uma pessoa amiga. Super receptiva. O problema – disse minha analista – é que eu falo, falo, falo tanto que ninguém consegue falar comigo. Mas eu nem lhes dou ouvidos. Eu sou bonita, jovem, inteligente. Sensível, caridosa e muito, muito criativa. Vivo sempre sorrindo, mesmo quando me esqueço de tomar meus antidepressivos. Eu gosto de sair, de dançar, de curtir a vida. Medo?! Eu não tenho medo, afinal, não é a experiência a mola propulsora diante dos desafios? Meu Deus, quem disse isso, mesmo? Bom, tanto faz. Adoro conhecer pessoas novas, lugares novos. Adoro viajar... Você está me ouvindo? Eu... Eu faço muitas coisas. Olho a empregada cozinhando, lavando, passando. Deixando tudo fora de mim perfeitamente organizado. Limpo. Vou às compras e trago sempre alguma coisa, mesmo que não vá usar nem um único dia. É divertido. Eu começo a ler um livro, me inscrevo em vários cursos, mudo de academia. Depois descubro que não era bem isso o que eu queria. Largo tudo. Aliás, acho que nunca terminei nada do que escolhi pra mim. De qualquer forma, me sinto bem assim. Sabe por quê? Porque sempre vou ter o que fazer quando me sentir deprimida. E, além do mais, todo começo me dá uma sensação agradável, aquele friozinho na barriga. Que logo passa, mas que é sempre bem vindo. Minha analista disse que tudo isso não passa de medo de me envolver por inteira. Disse que preciso parar de me emprestar e me entregar pra valer se quiser saborear de verdade os sabores da vida. Disse também – veja você o cúmulo da antipatia – que eu preciso deixar de ser tão impulsiva, mas eu não dou a mínima para o que ela diz ou deixa de dizer. Sou livre, estou pagando e não dependo de ninguém para ser bem quista! Sabe, eu não gosto desse tipo de conversa. Fico confusa, triste. Acho que preciso dar um tempo com a terapia também. Ora, só me faltava essa! Eu gosto mesmo é de fazer o que me dá vontade, sempre que me dá na telha, aconteça o que acontecer. Mesmo que depois eu me arrependa ou não me lembre de nada do que fiz. Assim, fica até mais fácil. Na verdade... Hei, espere um pouco! Você já vai?! Ainda tenho tanto para te contar! – acrescentou, mirando-se no espelho, alguns minutos antes de seus remédios reagirem.

Absurdo passar pela vida

Se não fizéssemos suposições, como o impossível se tornaria possível? Como o, até então inimaginável, se converteria em pensamento fundamentado? Em evidências para educar os sentidos? Nossas confusões, incertezas, dúvidas, tédios, precisam desses contrapontos. Desses contratempos para que façamos os exames constantemente. Os embates que nos permitem um mais acertado julgamento. Ao menos no momento. Tão logo apareçam outras representações que nos aproximem mais um pouco da realidade presente. Saber de nossos limites nos liberta da ignorância que muitas vezes nos leva a experimentalismos infrutíferos. Fazendo da natureza, dos outros e até de nós mesmos objetos. Massa pronta para engrossarmos as misturas que se integram na livre concorrência entre os corpos. Que se enxergam como meios e não como fins em si mesmos.