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26 de abril de 2022

bate palminha, bate!

bate palminha para aqueles que lhe exploram

e o transformam numa coisa sem vontade


bate o pezinho, bate!

fecha a cabeça, fecha!

trava o corpinho, trava!


faça o que o seu mestre mandar, faça

faça e não reivindique seus direitos jamais


seja mais um tolo que sobrevive aprisionado

achando que o ato de educar não passa de um fim

para incluir gente despolitizada no mercado de trabalho


tolo que se ilude com as gratificações por aprovações

mascara os dados sobre a frequência dos estudantes

que passam e saem das instituições escolares como você


um perfeito analfabeto funcional.

23 de abril de 2022

azia

como se desse um mergulho imprevisto

um passeio dentro de um redemoinho

fizesse uma dança na encosta

seguida de uma pirueta na beira do abismo


caindo no olho de um furacão

girando em turbilhões

até chegar ao maremoto mais destrutivo

à deriva de suas oscilações sísmicas


sentindo as causas de um incêndio criminoso

como se quebrasse a cara duas vezes seguidas

vangloriando-se por encontrar em si novas feridas

sorrindo com o que escolheu como saída


um exagero com as palavras

quando o suco gástrico se altera

não dispõe da comunicação entre os elementos

para produzir ou acionar as enzimas digestivas.

22 de abril de 2022

cataclismo

enche o reservatório

escorre do promontório

aquilo que procuramos e nos arrepia

mixando e sorvendo estes fluídos


que exalam de nossos corpos

nos curtas que vamos roteirizando

quando nos aproximamos dos olhos

em outras órbitas imergimos


conhecendo desconhecendo-nos

nos afetos, nas trocas de sentidos,

esbarrando em instantes

perdemo-nos nos encontrando


transbordados

por essas melodias.

coautoria

aquilo que se materializa

também se desmaterializa

como num sonho

seus intérpretes

vivenciam

provocam

idealizam

se emocionam

lembram

esquecem

tripudiam

enternecem

nem sempre se conhecem

ou se dominam.

13 de abril de 2022

periscópio

focado na estrutura

menosprezou a função

como numa ditadura

decretou sua submissão.

troca-se autoritarismo por compreensão

crítica radical

ativismo do intelectual

contra-hegemonia

inversão do individualismo trivial.

estilo

preciso tapar meus ouvidos

cruzar os dedos

desejar o que não me faz sentido


preciso criar juízo

ser mais comprometido

nos duelos em que me incluíram


preciso recarregar minhas armas

convencer-me de que estou seguro

quando há pessoas que me vigiam.

7 de abril de 2022

biblioteca

quando os livros deixados sobre as bancadas

começam a ser folheados

escritores e personagens saltam das páginas

assaltando a realidade


o leitor assustado, quase petrificado

procura fugir

mas logo se rende ao êxtase

de ver sua vida transbordada


uma bela dança se desenrola

cria-se um cenário inesperado

onde o medo passa a fazer parte

da experiência estética iniciada


entrelaçam-se utopias e pseudo determinismos

questionam-se as arbitrariedades

daqueles que querem que o velho establishment

seja aceito como única possibilidade.

1 de abril de 2022

Vigília

   Sonho com ruínas. Imagino um recomeço. Onde a arte impacta na qualidade da vida coletiva. Penso sobre um tempo em que há espaço. Para a convivência entre todas as etnias. Nenhum indivíduo ou grupo querendo o destaque. Conferido pela ilusão de um título. Nenhuma minoria lutando por identidade. Ou reconhecimento. Pois o estado não está sequestrado. Para garantir privilégios a grupos específicos. Para a sobrevivência. Trabalho criativo. Sem o menor resquício de exceder as necessidades e gerar mais-valia. Nenhum lazer ou consumismo para esquecer. Ou prolongar a subserviência homicida. Tempo livre para aprender e recrear. Ludicidade como nosso maior objetivo. Não há progresso dentro da lógica do trabalho. E da civilização imposta enquanto domínio. O sexo – de maníaco e desesperado – se desvencilha da rotina. Tornar-se liberdade. Integra-se à sexualidade. Ampliando as perspectivas. De nos realizarmos enquanto estamos vivos. Desprezando o prazer que nos serve como escapismo. Nessa catarse. Só quem se ilude com falsas ideologias. Pode se tornar um fatalista. Quem entendeu que a vida é construída. Sabe que as bases materiais. As estéticas advindas. Nossas subjetividades. Podem ser revolucionadas todos os dias. Para solucionarmos. Honestamente. O dilema do ser humano. Que não se humaniza.