Tom
e Marlon
terminaram seu trabalho. Arrumaram suas
ferramentas, pegaram suas marmitas vazias
e iam caminhando
para a rua
quando subitamente se lembraram de algo.
Era
sexta, o dia de passarem pela casa de seu amigo Denis
para jogarem algumas rodadas e tomarem aquele
porre invejável.
Subiram
no carro de Marlon
e voaram para o mercado na expectativa de acharem uma promoção de
cerveja gelada.
A
garota do caixa ficou desconcertada com a
quantidade, mas não deu a menor bola
quando eles começaram com as suas já ensaiadas cantadas.
As
mesmas que os fizerem conseguir a atenção de suas mulheres. Que,
segundo pensavam, estavam em suas casas e por lá ficariam esperando
até que eles
chegassem.
A
cerveja estava cara e morna, mas mesmo assim seguiram sua jornada.
Agora, só faltavam mais
alguns quilômetros e logo estariam na casa de Denis
para mais uma noitada.
-
Puta vida boa essa, hein! - disse Marlon.
-
Pode crer! - respondeu Tom.
-
Não existe nada melhor pra se fazer depois que a gente acaba o
serviço!
-
Só!
-
Cara, já reparou como a Sandra é estranha?
-
É… Você acredita que ela me pediu pra gente deixar o Denis
quieto. Não ir mais até a casa dele, que ela tá perdendo a
paciência.
-
Ah, véio… Isso é problema deles lá. A gente já se conhece há
tanto tempo... Se o cara quisesse que a gente parasse de ir lá, ele
mesmo falava, não acha?
-
Verdade. Mas ele tem que ver essa parada. A Sandra tá me olhando com
umas caras…
-
Caras?
-
É… Acho que se ela pudesse, ela me matava. E você também.
Cuidado!
-
Qualé! Ela é só uma mulher apaixonada. Loucamente apaixonada, mas
logo isso passa. Cê vai ver. Não passou com você e a Ana?
-
É, passou… Se bem que ela já me falou que se tiver festinha essa
semana, eu não entro mais em casa.
-
Isso é chantagem, cê tá ligado! Elas nos adoram, cara!
-
É… Talvez.
Estacionaram
e foram logo gritando para o
amigo vir ajudá-los
com as sacolas lotadas.
Sem resposta, foram abrindo a porta e se deparam com uma cena
bizarra.
Denis
estava estirado no chão. Uma bala no meio da testa. Ficaram alguns
minutos estupidificados. Nenhum dos dois se mexia, nem conseguia
dizer nada. Talvez sequer pensavam.
Passado
o choque, entraram para dar uma geral pela casa, mas
logo foram
surpreendidos
quando se depararam com a autora do crime bem ali, com a arma nas
mãos aguardando pelas próximas vítimas.
Calma,
sem qualquer indício de que temia alguma reação inesperada. Foi
logo abordando os rapazes e pedindo que escolhessem quem seria o
primeiro a levar
a próxima bala.
Marlon
recuou assustado, tentando fugir, mas mal teve tempo de se virar e já
ganhou a sua parte. Um tiro que o fez cambalear
e cair deixando uma boa parte
o quarto manchado de vermelho.
Aquela
cor que Sandra
tanto adorava.
Tom,
visto que não havia nada a fazer, foi logo ajoelhando e pedindo
desculpas, perdão por todos os pecados.
Sandra
escutou com calma, sorrindo daquele seu
jeito estranho, e tão logo acabou aquela ladainha, mirou e disse:
-
Quantas vezes
não avisei vocês que sexta é o MEU
dia de ficar com o Denis.
Que não quero ele mais andando
com vocês? Quantas vezes, hein?
-
Ah, então foi por isso?!
-
Claro que não, seu tapado!
-
Foi por isso e por todo o resto. Vocês sabiam que ele estava tendo
um caso! Sabiam e até trocavam sorrisinhos de
cumplicidade quando eu
estava por perto. Você acha que eu não sei?
-
Ei, espere! Do que é que você está falando?
-
Tô afirmando. Vocês sabiam. Aposto que todos tem os seus casinhos
por aí. Bom, tinham, né?
-
Como? Por favor! Eu não tenho caso nenhum e posso te provar…
-
Ah, vá se foder, cara! Eu não quero prova nenhuma. A merda já tá
feita. Agora só falta você. Me diz, o que é que você quer que eu
e a sua mulher escrevemos em seu túmulo: marido fiel, pai dedicado,
essas merdas todas?
-
Eu… eu… eu nunca pensei sobre isso. Olha, vamos conversar, deixa
eu te explicar...
-
Que explicar o caralho! Diga: que merda a gente escreve na tua
lápide?
-
Deixa eu ver: trabalhador, pai e marido. Deixou saudades.
-
Você é uma piada, né? Olha, já que
está com todas essas cervejas aí, me
passa uma que eu tô louca pra tomar a
minha gelada. Afinal, hoje é sexta, não?
- e ria, ria como se o riso fosse a sua
melhor cartada.
-
Tá... tá aqui. Só que não tá muito gelada.
-
O quê?
-
É, a gente pegou elas no mercado, você sabe. Esse horário é foda.
-
Ah cara, aí você pediu pra morrer mesmo, né! Cerveja quente,
porra!
-
Não foi culpa minha. Se você quiser eu vou pegar uma bem geladinha
pra você agora mesmo. Que marca você quer?
-
Você tá me tirando, né? Acha que eu vou pedir pra você ir pegar
cerveja pra mim?!
-
Eu só estava tentando ser gentil.
-
Agora? Vai ser gentil na caso do caralho!!!
-
Sandra, olha, não tenho nada a ver com isso, tenho mulher e filhos e
não tô podendo morrer agora não, sabe?
-
Sei, mas vai. Não tem outro jeito. Vai levar um balaço no meio da
cara pra ir junto com os teus amigos. Vocês três vão poder se
divertir muito juntos!
-
Por favor! Não tem nada que eu possa fazer para não morrer?
-
Deixa eu ver… Não, não tem. Isso é parte do destino. Não do
seu. Você cruzou o meu caminho. Não tem volta. Agora fica bem
quietinho que não vai doer nada.
-
Não, Sandra!
Eu faço qualquer coisa! Juro que faço. Saio correndo daqui, ninguém
vai me ver, não falo nada. Eu imploro!
-
Que lindo! Mais um covarde. Meu, você não entendeu que eu preciso
dos três mortos juntos?
-
Por quê?
-
Ora, porque é assim que eu imaginei. É assim que tem que ser.
Levantou
tranquilamente a
arma que estava apoiada no seu colo,
mirou e cumpriu com
o combinado.
Em
seguida, foi até a sala, abraçou o seu
amante, beijo-o
e desejou ficar
com ele pra sempre. Só pra ela. Para todo
o sempre. Ou até ambos
se cansarem
daquele marasmo.