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12 de abril de 2011

Passatempo


        As bebidas acabaram. A notícia não causou surpresa. Nos porões, apenas aquele velho conhecido tumulto involuntário. De órgão a órgão o horror era difundido. Reavivado. A possibilidade já havia sido cogitada. Confirmada a premissa. O pensamento estimulava. Conhecia-se a verdadeira finalidade. Alguns estrategistas agiram rápido. Após uma eternidade, um entregador era saudado. Aplaudido por ser mais um no interior da espaçonave. Os mais missionários até o ajudaram. Como autênticos profissionais da sensibilidade. Pagaram. Reconhecido e solucionado o problema. A festa continuava. Retomou-se o equilíbrio almejado. Durante toda a quinzena, divulgado. Combinado. As mulheres pagaram meia entrada! Justiça seja feita. Até a banda ficou mais motivada. Interpretava os DJs de maior sucesso das melhores baladas. As fantasias reacenderam sua áurea. Não eram simplesmente diferentes, mas melhores. Evoluíam. Impressionavam até quem as ignoravam. Atrás do palco. Pelos cômodos da casa. Em cima das árvores. Expressavam-se alheadas das seguradoras que se formavam. Co-dependentes. Relacionavam-se. Alguns conseguiam. Outros protestavam. Bebiam. Fumavam. Discursavam sobre as teorias analisadas. O conteúdo de que mais se lembravam. Sorriam. Flertavam. Beijavam. Revezavam-se. Por inteiro se emancipavam. Quem não havia sido convidado. Desistira de sair. Resignara-se ansioso em sua casa. O esquete não lhe comportava. Entediado, um roadie trabalhava. Fazia parte da farra. Representava o seu papel em mais um entretenimento daquela casta. Concentrado em iluminar os músicos e em entregar-lhes as roupas e acessórios mais adequados. Seu estômago fazia com que sua mente encontrasse algumas palavras. Frases. Conexões. Significados. Para as causas de tanto estardalhaço. Que diferença fazia tudo aquilo? Pra ele? Para os outros? Para aquela ninhada de ratos que vivia na dispensa daquela casa? Para aquela coruja? Para aqueles morcegos aninhados naquela calha? Aquele luxo disfarçado era algo que ele sempre haveria de encontrar assim? Vibrando tanto para depois sair carregado? Socialmente vivos. Naturalmente exaustos. Todas aquelas embalagens esticadas serviam para acomodar o vácuo que negavam? Sentimentalismos postiços publicados em folhas amareladas. Davam mais status. Acreditavam que estavam expandindo suas potencialidades? Conquistando maior credibilidade? Que diferença fazia toda aquela guerra? Se, só depois que os exércitos são dizimados, entendemos que as diferenças unificavam? Todo aquele linguajar afetado, pomposo, descartável. Que tentava dizer tantas coisas e não conseguia dizer nada. Mas imperdoavelmente deixava claro que todos estavam descontrolados. Procurando pelos meios mais fáceis para se desvencilharem do fardo de serem excelentes operadores de seus próprios maquinários. Que diferença fazia experimentar todos aqueles produtos? Ter dentro de si todas aquelas drogas? Sintetizavam? Acreditavam que, atingindo os limites físicos, ficariam mais elevados, mais verdadeiros, sedados? Os desencanados eram os alvos mais cobiçados. Porque seguiam os mandamentos. Praticavam os exercícios da complexidade. Duas horas por dia. Três dias da semana. Nas academias. Acumulando. Ganhando massa para compartilharem com o orgulho realimentado. Até chegar ao ponto da exaustão e odiarem a si mesmos por terem sido tão responsáveis. Marchando com suas consciências engatilhadas. Mendigando compreensão. Pessoalidade. Qualquer fragmento de emoção. Consolados quando há alguma espécie de repercussão. Intimidade. Crianças instruídas. Encantadoramente livres quando confinadas. Cumprindo ordens. Espiritualmente válidas. Você sabe como é! Afinal, as obrigações são tantas... De minha parte, acredito nos frutos dessas sutis colisões. Que venham as mutações! Fios descascados conduzindo energia para a seletividade. Canos furados canalizando os nutrientes para o que é necessário. Viva a urgência, a excelência e, sobretudo, a praticidade, para conseguirmos ter mais um dia justificado. Sempre em busca da verdade, é claro!

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